Fé e Política: Espiritualidade, Ecologia e Economia
Delze dos Santos Laureano
Cuidar da vida sob as dimensões da Fé e da Política passa inevitavelmente pelo entendimento de qual é o nosso papel neste mundo como pessoas cristãs, considerando de antemão que somos seres sociais e políticos. Todos querem viver bem. E viver bem, acredito, é viver em paz, com espiritualidade plena em um ambiente ecologicamente saudável, tendo as necessidades vitais dignamente resolvidas, o que ocorre com a distribuição equânime dos recursos econômicos. Mas como vamos enfrentar essa tarefa de criar por meio da política as condições adequadas de convivência justa e solidária neste mundo?
Esse é um desafio a ser resolvido coletivamente. O poder político, que é terreno, somente poderá ser atribuído a seres humanos, pois sabemos da inexistência de deuses governantes. Platão, de forma eloquente, ensinou que a política não é o melhor lugar para projetarmos nossos anelos de uma existência perfeita, justa e feliz. Para isso seria necessário a volta à idade de ouro, ao governo dos filósofos-reis, o que é manifestamente impossível.
No mito de cronos temos a notícia de uma sociedade na qual os governantes não eram homens, mas semideuses (daimons), que graças à sua filantropia faziam reinar entre os homens a paz, a sólida justiça e a paz perpétua. Mas o mito conclui, e nisto é verdadeiro ainda hoje, nos estados onde reina não um deus, mas um mortal, os cidadãos não podem ser livres dos males e da labuta. Não há como eliminar o mal da vida humana imaginando vivermos em uma sociedade farta e sem trabalho, onde tudo já está pronto.
Diferentemente do que muitos acusam Platão não tentou legitimar o poder político absoluto, antidemocrático, atribuindo poder divino ao ser humano para a salvação de todos. O que nos mostra Platão é que no governo imperfeito de humanos as leis é que conduzem à virtude. Todavia, a nossa experiência revela que as leis estão sujeitas à interpretação. E a interpretação é a de quem está no poder. Leis não guardam em si mesmas um sentido determinado, surgindo daí a necessidade da participação de todos para que elas sejam aplicadas de forma justa.
Na Bíblia, no Salmo 23, o Bom Pastor, ajuda-nos no reconhecimento de uma trajetória humana rumo à realização plena do ser humano. Nas linhas, mas principalmente nas entrelinhas, o texto mostra a necessária interdependência de valores espirituais, ecológicos e econômicos para a realização integral do ser humano.
Mas, o que é ser um bom pastor? Platão mostra que o pastor é também ovelha. Na Bíblia o pastor é aquele que cuida conduzindo por águas tranqüilas. Ser pastor é seguir à frente, pois o vaqueiro é que vai atrás. O pastor segue adiante do rebanho com o seu cajado, descobrindo entre as pedras as falhas que põem em risco a vida. Todo caminho tem riscos e inimigos.
As “águas tranqüilas” – espiritualidade – é a paz na caminhada, fruto da justiça e do cuidado. É a mística e a paixão que nos guiam pela vida. Na política, o líder não pode se esquecer que conduz pessoas e não coisas. As “verdes pastagens” – ecologia - são lugar de descanso, mas também de caminhada. Lugar onde se sente prazer, contudo, sem cair nos riscos da zona de conforto. É preciso seguir sempre em frente e experimentar na nossa vida a partilha, “mesa farta” para todos – dimensão econômica -, onde transbordam taças, mesmo diante de adversidades.
Essa então a nossa morada, lugar onde poderemos ser ungidos com a certeza da vida plena: Travessia!
Nova Lima, 11 de julho de 2011.
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