segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A Delze acredita, a Laurinha também!

A DELZE ACREDITA, LAURINHA TAMBÉM!

Virgílio de Mattos

O velho trabalhador coça a cabeça desconfiado, que história é essa, logo agora, de um filho?
Embora a situação não esteja pra isso, afinal com a idade que tem nem as construtoras que estão laçando qualquer burro pro trabalho duro, se interessam pela sua experiência em fazer qualquer coisa com madeira, operário que, assim como seu pai, levou a vida inteira vendendo a única coisa que podia vender: sua força de trabalho. Está desempregado e velho. Inexoravelmente velho, desgraçadamente desempregado. E ainda por cima com um filho pra criar, logo agora?
Em qualquer outro final de ano do passado a notícia seria bem-vinda, mas agora, sem emprego e sem perspectiva, é que essa velha conformista vem dizer que está grávida?! Pensa alto um “merda” e segue martelando uns restos com os quais pensa em fazer um berço na frente do barracão que acumula as funções de casa e oficina, onde se lê FAZ TUDO, com o zê grafado ao contrário, como se estivéssemos lendo num espelho. José é um hábil artesão mas tem pouco contato com a escrita.
Nem as línguas mais maledicentes do entorno ousam falar mal dela, conformista conformada com uma vida de percalços e sustos, mais sustos do que percalços nessa época das águas destruindo tudo. Nem ela mesma acredita que esteja grávida quando pensava tratar-se da menopausa. E agora? Como é que vai ser? O que vai ser desse menino ou dessa menina?
Na ocupação crepitam esperanças como se fossem fogos de artifício, ainda que os planos repressivos estejam sempre prontos através dos tempos. Os poderosos raciocinam: “é só uma questão de tempo”.
Faz mais de dois mil anos que os filhos pobres dos pobres trabalhadores, sejam eles qualificados ou não, sofrem o mesmo tipo de exploração: a eles só restará vender a própria força de trabalho...
Faz muito tempo que Delze e Laurinha acreditam nessa fábula da mulher do carpinteiro ainda virgem ter engravidado do espírito santo. Mas eu sempre pensei que isso fosse uma fábula, ou quando muito uma parábola. Ninguém pode acreditar numa estória dessas através da história, não faz sentido.
Eu penso na dificuldade daquele carpinteiro explicar pros vizinhos da ocupação aquele filho. Penso nas tropas especiais da polícia procurando a criança pra ser destruída, penso nos barracos destruídos não pelas forças repressivas a serviço da exploração, mas pela burrice dos alcaides de plantão em pensar – poderosos de ocasião – que podem conter a força das águas com estupidez e concreto, grana por fora das empreiteiras e gana de acumulação.
Penso, sobretudo, nos idiotas que naturalizam essas questões com o mais estúpido ainda “sempre foi assim”. E que transformam o aniversário de um deus que Laurinha e Delze acreditam na verdadeira festa dos comerciantes.
NÃO COMPRE!
Nesse natal e nos outros não caia na armadilha, esteja preparado para denunciar as religiões, essa droga poderosa, e, sobretudo, a epidemia de falta de solidariedade – esse atoleiro – que pululam como cogumelos nessa época das águas.
Despreze as ilusões, leitor molhado, prepare-se pra luta. Nisso também a Delze e a Laurinha acreditam, e você?

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